Prezado Prof. Rubim,
“A cultura se desenvolve através do intercâmbio.” Esta sua frase, lida em “A TARDE” e com a qual concordo plenamente, motivou-me a escrever-lhe. Vou restringir-me ao segmento cultural da música popular, tão presente na Bahia, principalmente no Carnaval, assunto de sua crônica.
Sou de um tempo em que crianças e adolescentes tinham a oportunidade, em escolas públicas, de serem educados nos princípios da Teoria Musical e de participarem ativamente nas atividades correlatas como os corais, em que Villa-Lobos convivia com Ary Barroso. Hoje a realidade é outra e nossos filhos aprendem os acordes que escutam nas ruas e na “media” eletrônica. A qualidade, convenhamos, deixa a desejar.
Em outros países, mesmo os que também são sufocados pela “media” de padrão duvidoso, há um certo esforço para que o padrão cultural da música popular seja mantido ou elevado. Refiro-me especificamente ao Jazz e suas manifestações. Por não se tratar de um gênero musical, mas sim de uma maneira de tocar (abrangendo improvisações, harmonias muito ricas, técnica instrumental apurada, ritmos incorporados de inúmeras fontes) há uma universalização inconteste em sua prática. Isto pode ser observado, por exemplo, nas dezenas de festivais de jazz realizados anualmente na França (aliás, país campeão mundial em turismo e em herança musical através dos tempos). Em se tratando do continente europeu, os festivais podem ser contados às centenas e os intercâmbios são intensos.
No Brasil podemos observar algumas manifestações importantes, não apenas no Sul/Sudeste, mas nos festivais internacionais de Recife, Guaramiranga (Ceará) e Manaus (onde a mesma equipe, vinculada à secretaria de Cultura do Estado, cuida também do festival internacional de ópera). Estes festivais são realizados há mais de dez anos, com grande sucesso.
A Bahia, terra mais musical do mundo e mais herdeira musical da África do que New Orleans, nunca realizou um festival internacional de jazz. O denodo de algumas pessoas apaixonadas tem resultado em realizações muito positivas, mas com pouco resultado em termos do nosso tema central de “intercâmbio”.
Outra questão importante é o fato da existência entre nós de alguns dos melhores jazzistas brasileiros, dentre os quais poderia mencionar Joatan Nascimento (trompete), Letieres Leite (sax), Rowney Scott (sax), André Becker (sax), Jurandir Santana (guitarra), Ana Paula Albuquerque (voz), Ivan Huol (bateria), Paulo Andrade (sax), Luis Assis (piano), Marcos Carvalho (piano) e inúmeros outros. Destaca-se o fato de que a maioria deles toca em bandas ditas “de Carnaval”, injetando-lhes um pouco de seus talentos. Não é, porém, parte de suas verdadeiras vocações (alguns têm doutorado em música pela UFBA).
O quadro atual do jazz na Bahia é de quase absoluta penúria, principalmente no que se refere ao intercâmbio, essencial para seu desenvolvimento. No passado, o Teatro Castro Alves recebia com frequência destacados músicos internacionais que influenciaram toda uma geração. Hoje, eles voam diretamente para outros estados, como aconteceu recentemente com Tony Bennett, que foi diretamente se apresentar em Recife.
Estes são apenas alguns pensamentos que espero possam contribuir para suas realizações de “intercâmbio” cultural na música popular da Bahia.
Atenciosamente,
Ricardo Silva
Secretário
Sociedade para Apreciação do Jazz – SOJAZZ
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