Existem três fortes razões para ouvir e se apaixonar pelo disco de “Junte Tudo O Que É Seu...” de Carlos Navas. A primeira delas é a linda voz e interpretação certeira e encantadora do autor do disco. A outra, é que Navas é acompanhado ao longo de toda a gravação apenas pelo lindo piano de Gustavo Sarzi. A terceira e definitiva razão habita o olimpo de nossa canção popular. O disco inteiro é formado por canções de Custódio de Mesquita.
Posto isto, seria óbvio e temeráio que algo aí pudesse não funcionar. Não basta, assim como quem prepara uma receita qualquer, juntar três grandes ingredientes para que tudo dê certo. As coisas precisam se harmonizar, tudo precisa estar, enfim, em perfeita sintonia.
Navas, em seu nono disco, nos dá a impressão de que nasceu para cantar essas canções. Suas pausas curtas, o ritmo contido, a intensidade com que pronuncia os versos, parece que nasceram colados às obras de Custódio desde sempre.
Por sua vez, a economia e o bom gosto de Sarzi nos lembra, de forma irônica, o piano de Tom Jobim. A ironia reside no fato de Custódio Mesquita ser um dos compositores preferidos do maestro soberano. No entanto, ainda que a sonoridade aqui e acolá nos deixe impresso algo de Tom, o jeitão geral da gravação está muito mais para as saborosas invenções dos anos 1930 e 1940, do próprio Custódio. O acertado seria dizer que tanto Tom quanto Navas, com Sarzi, beberam da mesma fonte.
A música de Custódio de Mesquita tem algo de trágico e, ao mesmo tempo, irônico, irreverente. Um humor sutil, quase imperceptível, que serve de alento ao drama que , invariavelmente, se desenrola nas canções. Um contraste difícil, que acaba por conferir ainda mais genialidade à obra. Navas percebe isso com muita riqueza e consegue, ao mesmo tempo, ser intenso e relaxado, resultado de inteligência e intuição funcionando juntas.
O disco traz ainda a participação das cantoras Rosa Marya Colin, na clássica “Nada Além”, feita em parceria com Mário Lago, e Alzira E., em “Nossa Comédia”. Navas teve o cuidado de , no encarte, fazer um breve comentário em cada faixa, sempre homenageando o seu intérprete original e, consequentemente, as suas grandes influências vocais. Vale lembrar o que o lindo repertório de Custódio Mesquita é de um tempo em que o público não identificava o compositor. São, portanto, no consciente coletivo, canções de Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Aracy de Almeida, Mário Reis entre muitos outros.
Carlos Navas, ao mesmo tempo em que, de certa forma, corrige esse pequeno engano, o reafirma. Com as suas interpretações e um álbum muito bem cuidado, ele transforma esses clássicos do passado em canções um pouco suas também.
Faixas :
1. Velho Realejo
2. Valsa de um Subúrbio
3. Adivinhe Coração
4. Enquanto Houver Saudade
5. Como os Rios que Correm pro Mar
6. Noturno em Tempo de Samba
7. Nada Além
8. Flauta, Cavaquinho e Violão
9. Doutor em Samba
10.Prazer em Conhecê-lo
11. Mentirosa
12. Nossa Comédia
13. Saia do Caminho
Fonte: Julinho Bittencourt / Revista Forum
Um comentário:
Tenho este disco e concordo com cada palavra do artigo. Excelente!!!
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