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sexta-feira, 6 de março de 2015

MÁRCIA CASTRO – DAS COISAS QUE SURGEM (Sony Music)

Baiana de berço e sotaque, a cantora Márcia Castro desconstrói a cada disco. Na estreia, Pecadinho de 2007, trilhava um lado B da cidadela do axé, ao optar por autores como Tom Zé, Tuzé de Abreu, J. Veloso, Roque Ferreira , Luciano Salvador Bahia , ao lado dos destoantes da mesmice Sérgio Sampaio, Zeca Baleiro, Itamar Assumpção e Jorge Mautner. O álbum seguinte, De Pés no Chão (2012), a começar pela faixa-título, pinçada entre as obscuras e farpadas de Rita Lee (lacinhos cor-de-rosa / ficam bem num sapatão) , revirava os baús de uma MPB intempestiva. De um sombrio Cartola (Catedral do Inferno , com Hermínio Bello de Carvalho) a um eriçado Gonzaguinha (Pois é , seu Zé ), uma renegada veia pop dos Novos Baianos (29 Beijos) e o clássico alternativo Logradouro (Kleber Cavalcanti / Rafael Altério).

Das Coisas que Surgem , produção de Gui Amabis, autor das cruciais Um Bom Filme, Esculacho e Partículas de Amor (com Lucas Santanna) , incluídas no roteiro, tira do avesso da intérprete, de emissão límpida e extrovertida , um recôndito intimista. Aflora a compositora de dicção epitelial, em aliança com o poeta arrudA, habitual parceiro de Alzira Espíndola. Como em O Amor Tem Dessas (estilhaça, atormenta / tira a fome, alimenta), num embalo de bolero e a balada Beijos de Ar (sem paz, sem pólen / no coração desse ciclone). De outros autores, tanto o sagaz Mau Caminho (Arnaldo Antunes /Alice Ruiz ) quanto o alado Três da Madrugada (Torquato Neto / Carlos Pinto), cinzelado pelo cello de Jacques Morelenbaum, afinam-se com a imersão urbana da cantora m radicada em São Paulo desde 2008. Encerra o disco, de rara coesão conceitual, o autorretrato autoral da artista em processo: O que me move / é o que me falta.


Fonte : Tárik de Souza (CartaCapital)

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