Terri Lyne Carrington nunca se afastou de discussões de
justiça. E, em adição, apresenta vozes como a da ativista de direitos sociais e
autora Angela Davis de diversos projetos. Carrington iniciou no Institute of Jazz da Berklee College of Music e na Gender Justice em 2018. Mas, seguramente,
qualquer coisa que ela fez anteriormente pode preparar os ouvintes para “
Waiting Game”, que deu um golpe de mestre com um disco duplo com o clássico do
hip-hop, Kendrick Lamar, em 2015, “To Pimp A Butterfly”, ou melhor ainda, com a
produção multimídia de Carrie Mae Weems, em 2016, “Grace Notes: Reflections for
Now”.
“Waiting Game” absorve um pouco do movimento da fervilhante
fúria de Black Lives Matter (NT:
Vidas de Negros Importam, em tradução livre) —tão bem quanto o #MeToo movement—e converte-o em
combustível artístico, conforme ela aborda homofobia e o genocídio dos nativos
americanos. Similar a Weems, Carrington se destaca na articulação acumulada, em
emoções conflitantes e fadiga mental induzida por insistente bombardeamento de
doenças sociais. Seu foco nas composições embasadas nesse cenário durante a
primeira metade do álbum ajuda a modelar a clareza temática, como faz a
cintilante harmonia, que ela choca com sua banda, Social Science.
Um pressentimento de aflição permeia o primeiro disco, assim
como transporta uma série interminável de injustiças sociais e o stress de ser
apanhado neste ciclo. A sombria “Trapped In The American Dream” estabelece a
entonação das batidas marciais de Carrington, a repetitiva frase musical do pianista
Aaron Parks, o guitarrista Matthew Stevens e o uivante coro da vocalista Debo
Ray providenciam uma canção triste sobre o rap que Kassa Overall coloca sobre a
cobertura dos horrores. Dentro dos obstáculos interligados discutidos aqui está
a polícia da brutalidade, particularmente contra as pessoas de cor. Carrington,
entretanto, coloca isto dentro de um foco mais afiado durante “Bells (Ring
Loudly)” no qual Ray canta a perspectiva de uma morte de uma mãe após a morte do seu filho ter sido assassinado
pela polícia. O tempo salta para a Crescent
City na mordaz “Pray The Gay Away”, uma repreensão zoando do cantor gospel
Kim Burrell, em 2016, através de um discurso homofóbico. Embaixo da melodia com
sabor de Oriente Médio e sob o solo dilacerante do trompete de Nicholas Payton,
alguém ouve o antídoto—“reze para o ódio ir embora”.
Carrington dedica o segundo disco de “Waiting Game” a
“Dreams And Desperate Measures”, uma maravilhosa suíte em quatro partes
orquestrais que inicia com um arranjo fino de instrumentos de palhetas
assombrosas, cordas melancólicas, uma guitarra reflexiva, piano e baixo, todos
em diálogo.
A extensa improvisação, gradualmente, envolve um balanço ondulante,
impulsionado pelo elástico ostinato do baixo de Esperanza Spalding.
Após receber um Doris
Duke Artist Award, Carrington conclui outro triunfante ano com o lançamento
em um projeto completamente ambicioso, uma gravação que poderia ser o melhor
álbum de jazz do ano.
Faixas: Disco Um: Trapped In The American Dream; Bells (Ring
Loudly); Pray The Gay Away; Purple Mountains; Waiting Game (A capella); Anthem;
Love; No Justice (For Political Prisoners); Over And Sons; If Not Now; Waiting
Game. Disco Dois: Dreams And Desperate Measures, Parts 1–4. (67:14/42:19)
Músicos: Terri Lyne Carrington, bateria, vocal; Aaron Parks,
piano; Matthew Stevens, guitarra; Kassa Overall, toca-discos, vocal; Esperanza
Spalding, baixo, vocal; Morgan Guerin, saxofone, EWI, baixo, bateria; Nicholas
Payton, trompete (3); Malcolm-Jamal Warner (1), Meshell Ndegeocello (7), Mark
Kibble (5), Debo Ray (1, 2, 7, 11), Rapsody (6), Kokayi (4), Maimouna Youssef
(9), vocal; Raydar Ellis (3), toca-discos.
Nota: Este álbum foi relacionado
entre os 40 melhores de 2019 de acordo com os críticos da JazzTimes.
Fonte: John Murph (DownBeat)
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