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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

INÉDITOS NA DISCOGRAFIA DE ITAMAR ASSUMPÇÃO


A fina flor da cena paulistana independente celebrou na quarta-feira,08/09, no Sesc Pompeia, o pré-lançamento da Caixa Preta, projeto grandioso realizado pelo Selo Sesc, reunindo todos os álbuns do compositor paulista Itamar Assumpção (1949-2003), entre eles dois inéditos, Pretobrás II - Maldito Vírgula, produzido por Beto Villares, e Pretobrás III - Devia Ser Proibido, com produção, arranjos e direção musical de Paulo Lepetit, baixista, arranjador e fiel parceiro de Itamar. É ali mesmo nessa unidade do Sesc que cada um desses 12 discos serão recriados na íntegra em shows durante todo o mês de outubro, com participação de todo o elenco que abrilhantou os CDs inéditos.

Arquivo/AE'Caixa Preta' traz obra de Itamar Assumpção".A gente não inventou nada. Foi tudo ideia do meu pai", disse Anelis Assumpção, que divide com a irmã Serena e Villares a direção artística de um dos CDs. Anelis referia-se tanto à Caixa Preta quanto aos sucessores de Pretobrás - Por Que Que Eu Não Pensei Nisso Antes?, que Itamar realizou em 1998.

Genial e genioso, Itamar tinha fama de "maldito" na mídia e de "difícil" no meio musical. A produção de seu último trabalho em vida, Isso Vai Dar Repercussão, com Naná Vasconcelos, foi conturbada. Agora, trabalhar para ele em sua ausência proporcionou a músicos como Lepetit, o guitarrista Luiz Chagas e a cantora Suzana Salles - que fizeram escola com Itamar na antológica banda Isca de Polícia - momentos de maior liberdade. "Pude fazer meus solos à vontade", brinca Chagas. "Ele punha fogo pra gente tocar. Depois, claro, cortava." Para ele, o trabalho fluiu com naturalidade porque a banda não parou, mesmo com a morte do líder. "Nunca paramos para questionar a ausência dele."

Chagas, como Suzana, reconhece o amadurecimento do compositor. "Ele passou o período de ser complicado para outro em que ficou sofisticado e depois simples demais. O barato dele era entrar no estúdio, fazer um loop de dois acordes e compor a letra em cima. Aí a gente complicava. Depois voltou a fazer música com mais acordes", diz o guitarrista. Mas o que é aparentemente simples em Itamar não é fácil para os intérpretes, como se constata, por exemplo, em Grude, interpretada por Ney Matogrosso, e em Elza Soares, com a própria. "Ele vivia em constante renovação. Era aquela água brotando que todo mundo ia lá beber", afirma Suzana.

Linguagem. É reconhecível no Pretobrás III a inconfundível linguagem sonora de Itamar, que para Lepetit foi "uma faculdade", mas a sonoridade é outra. Está mais limpa. "Ele gostava de meter a mão em tudo, inclusive na mixagem, que ele não entendia", diz Suzana. O som dos discos do Itamar nunca conseguiu corresponder ao dos shows. É notório. Itamar ao vivo era outra coisa. Quem não o viu e só ouve os CDs não tem a dimensão do que era o som dele de verdade. Desta vez vai ter não só a dimensão captada adequadamente em estúdio, como também essa história nova do Beto Villares."

Villares e as irmãs Assumpção reuniram expoentes da nova geração da cena independente, como Curumin, Pupillo, Marcelo Jeneci, BNegão, Rodrigo Campos, Bruno Buarque, Antonio Pinto, Thalma de Freitas, Iara Rennó, Céu, o eterno moderno Arnaldo Antunes, Antonio Pinto, e o próprio Villares, fazendo com inteligência a ligação da modernidade do passado com a atual.

Há diferenças evidentes nos dois discos. O de Villares é o que Chagas chamou de "disco de produtor, que Itamar certamente abraçaria" e Anelis avalia o resultado como o ideal pop que seu pai queria para sua música. Não que a produção de Lepetit não seja pop, mas ali é um trabalho de uma banda que evoluiu com o compositor. Não havia sugestões de arranjos nem nada. "A gente trabalhou tanto tempo juntos que as linguagens se confundem, tanto a minha de arranjador como a da banda. É uma coisa que tem uma identidade", diz Lepetit. "Então, foi razoavelmente fácil chegar a esse resultado. É muito natural pra gente."

Isca, Naná e Alice. O músico, que também trabalhou em esquema parecido em Isso Vai Dar Repercussão (2004), com voz, violão e percussão, chamou Naná a princípio para tocar em cinco faixas, mas ele quis mais e deixou sua marca profunda em oito. A maioria deles, a propósito, foi composta no período do trabalho com Naná. "Ele estava muito criativo, a cada dia chegava com duas, três músicas novas", lembra Lepetit.

Ele, porém, queria fazer um disco, "a partir da banda", evitando, no entanto, reunir muitos convidados . "Muita gente passou pela Isca de Polícia, não dava pra chamar todo mundo." Mas, como ele mesmo confirma, a banda está bem representada por Chagas, Suzana, Bocato, Vange Milliet e Marco Costa.

A única letra dos dois álbuns não assinada por Itamar é Devia Ser Proibido . Aqui ele é o personagem que inspirou a poeta Alice Ruiz, grande parceira dele em outras canções antológicas. Personagem não é bem o termo para se referir a Itamar no ponto da evolução musical. Suzana lembra que Luiz Tatit já tinha dado o toque num texto no songbook de Itamar a respeito de sua evolução como compositor, quando deixou de representar o "personagem" Nego Dito. O resultado está aí "pra provar pra quem quiser ver e comprovar".

Fonte : Lauro Lisboa Garcia / O Estado de São Paulo
Colaboração : Gileno Xavier

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